Quando em Fevereiro fui passear para Amsterdão não resisti em trazer comigo algumas revistas, como habitualmente faço sempre que viajo, uma delas foi a Flow. E acho que pela primeira vez encontrei numa revista um artigo que me prendeu a atenção do início ao fim. A cada parágrafo que lia só pensava para mim “É isto… é mesmo isto!”. O artigo era sobre o Slow Working, uma tendência que tem vindo a surgir já desde 2012, mas sobre a qual se fala pouco.
Essencialmente é um movimento que promove o trabalhar menos, mas melhor, o ter tempo para outras coisas da nossa vida, o dar importância ao que o nosso corpo nos diz e arranjar tempo para o ouvir. Tudo em prol de uma vida melhor, mais saudável e feliz.
Num mundo que vive em passo mesmo muito acelerado, em que se gosta de dizer o quão ocupados estamos e que nunca temos tempo para nada, falar em qualquer slow é quase soar a “sou uma preguiçosa e não tenho grandes objectivos!”. Quem me acompanha há algum tempo sabe que o meu percurso mudou bastante nos últimos 13 anos. Com uma licenciatura em Psicologia Organizacional, trabalhei como psicóloga em escolas durante 3 anos, como consultora durante 4 e depois dei início a esta mudança de vida para freelancer como fotógrafa e designer.
Sei o que é trabalhar sob uma pressão tremenda, o exigirem de nós o que nem nós sabemos se vamos conseguir dar, o não ter vida própria e a vida social resumir-se aos cafés, almoços e jantares com os colegas de trabalho… enquanto se trabalha. E depois percebi que não era por ali que queria seguir. Percebi que queria mudar, fazer coisas diferentes para as quais nunca tinha estudado, trabalhar por mim e para mim, trabalhar com pessoas, e ser eu a decidir o horário de trabalho.
Mas como em muitas outras coisas da vida, fazer-se o que nos apaixona por vezes faz com que nos dediquemos de tal forma, que a nossa vida resume-se a isso. E depois é inevitável que se chegue também ao ponto de saturação. E se o nosso trabalho for maioritariamente criativo, isso é um problema. Um enorme problema.
Por isso, ao longo destes últimos 5 anos desde que me tornei freelancer, fui passando por diversas fases, ajustando aqui e acolá, trabalhando 12h, 14h, 16h por dia, às vezes porque era preciso, outras vezes porque me sentia tão inspirada que nem sentia sono ou fome. Outras vezes impunha-me horários “normais”, mas trabalhar em casa é tricky, e de uma forma ou de outra, o trabalho está sempre a dois passos. E passei ainda pela fase de trabalhar pela noite dentro e descansar de manhã, porque sempre foi o mais natural para mim.
Mas nos últimos anos percebi também que fazendo o que nos apaixona e fazê-lo em demasia, pode também prejudicar outras partes da nossa vida, esta coisa de ser workaholic é giro de se dizer quando é por nós, mas pode ser tão problemático como quando é para os outros.
Por outro lado, a sociedade em geral parece só dar-nos o valor quando estamos a faturar imenso, quando não temos tempo para nada, e quando estamos presentes em todo o lado das redes sociais e afins. A sociedade evolui a uma velocidade tremenda e se nos deixarmos estar no nosso canto a trabalhar, quando damos por ela já existe uma nova tendência qualquer à qual deveríamos estar a dar atenção.
E quando é que isto pára? E quando é que temos tempo para apreciar tudo o resto? E quando é que o nº de horas que trabalhamos não é o importante, mas o quão produtivos fomos nas horas que trabalhámos? E quando é que dizer que temos tempo para ir ao ginásio, ir às compras, fazer o jantar calmamente, não trabalhar fora de horas… começa a ser importante e de valor?
É por isso que eu me identifico tanto com este slow movement e procuro adotá-lo no meu dia-a-dia. Além de que noto que com os anos a passar, há coisas que começam a ser de facto diferentes. Sempre que me sinto bastante produtiva, trabalho horas sem fim e tento concretizar tudo em que penso, rapidamente passo de uma sensação boa para uma sensação de cansaço que se arrasta durante a semana.
É por isso que o equilíbrio é tão necessário. Parar para apreciar o que nos rodeia. Parar para estarmos com quem é importante para nós. Parar para não fazermos nada e dar espaço e tempo ao nosso cérebro e corpo em geral para descansar. Parar para escutar o que o nosso corpo nos diz. É que parece óbvio que viver a correr não nos vai trazer nada de bom… e neste caso, chegar ao fim mais depressa é de longe o que todos queremos evitar.
Tudo isto parece ser fácil de ler e de pensar, mas é para lá de difícil de concretizar, mais uma vez por tantas pressões que sentimos vindas de tantos lados diferentes. Mas pareceu-me importante escrever sobre isto, escrever para que eu também possa integrar tudo isto e deixar de lado os sentimentos de culpa.
Escrever para partilhar que aquela máxima de que “o que os outros fazem não é o importante, mas sim o que eu estou a fazer!” é para ser levada a sério. Somos todos diferentes, e neste mundo actual em que nos é possível espreitar tudo o que os outros fazem, pode ser overwhelming, principalmente porque tiramos tantas e tantas vezes conclusões precipitadas sobre o que os outros fazem, têm e alcançam.
E por fim, deixo esta frase encontrada no Swiss Miss e que parece ser tão apropriada:
“Part of the problem seems to be that nobody these days is content to merely put their dent in the universe. No, they have to f***ing own the universe. It’s not enough to be in the market, they have to dominate it. It’s not enough to serve customers, they have to capture them.” por David Heinemeier Hansson.
(e uma das coisas giras que podem fazer é arranjar tempo para passear pela vossa cidade e ver as cores que vos rodeiam… impressionante como Lisboa esta repleta de cores absolutamente deliciosas!)
Marina says
Foi a primeira vez que visitei este blog e o primeiro post que leio é este… UAU!!
Parabéns, são temas tão, mas tão importantes os que falas aqui.
:)
claudia says
Oh Marina, que bom saber isso! Fico mesmo feliz com as tuas palavras! Primeiro porque estava na dúvida sobre se haveria de escrever, depois porque sentia ao mesmo tempo que queria mesmo escrever sobre estas coisas… e receber este feedback é mesmo muito bom! Sinto que serviu para algo bom! Beijinhos*
Mafalda Mendes says
Lindas as cores de Lisboa que captaste. Há muita luz nestas fotografias.
Em relação à tua reflexão, não posso estar mais de acordo. Mas não é nada fácil de concretizar, como muito bem dizes o primeiro obstáculo começa em nós. No sentimento de culpa de achar que devemos carburar ao máximo ou encarar o trabalho de uma forma diferente da maioria das pessoas. Não é nada fixe ser workaholic, é bem melhor ser lifeaholic. :)
beijinho beijinho
claudia says
Que bonito conceito Mafalda… Lifeaholic! É isso mesmo! O trabalho é bom e bonito, mas cada coisa a seu tempo e no seu lugar. Trabalhar em demasia não é cool, muito menos é cool todas as consequências a médio e longo prazo. Um beijinho*
Ines Lopes says
Interessante isto do Slow Working. Tenho que ler mais sobre isto :)
claudia says
É mesmo muito interessante! Adorei ler o artigo na revista e acho que naquela papelaria das revistas cool no Lx Factory, ainda a encontras! Eu cheguei a vê-la à venda numa papelaria mini e completamente normal na Rua da Madalena ;) Beijinhos**
Silvia Silva says
Óptimo texto. Nestes dias leio e escrevo pouco aqui pela web, porque dei mais uma volta na minha vida e passo dias sem me sentar ao computador. Cada vez vejo menos o que os outros fazem e me concentro no que faço. Fora isso tento estar presente com as pessoas que me rodeiam. Sinto saudades de algumas ligações online, de pessoas que são interessantes e com quem apenas convivo virtualmente. Mas, apesar de hoje ter uma responsabilidade maior do que anteriormente ao que ao trabalho diz respeito, consigo vivê-lo no momento em que ele acontece e não tenho qualquer tipo de ansiedade, nem o prolongo mais do que necessário, não sinto essa pressão. E ao ler o teu texto, dei por mim a pensar sobre isso. Também gostava de ler esse artigo. A ver se encontro a revista:) bjs e obrigada.
claudia says
Que bom receber o teu feedback Sílvia! E de facto isso foi uma enorme mudança para quem tinha uma presença online como a tua, e cujo trabalho era precisamente ajudar na presença online de outras pessoas. Mas leio o que dizes e fico tão feliz por ti, por te sentir feliz, e por ver que estás tão serena. E acho que este slow-living também nos há-de trazer isso… serenidade. E a serenidade é uma coisa tão boa de se sentir! É bom haver esta concentração no trabalho que fazemos e que queremos fazer. Acredito mesmo que é esse o caminho, ainda que isto não queira dizer que devemos seguir um caminho individualista… Julgo que não deva ser difícil encontrares a revista, porque não saiu mais nenhuma depois dessa. Um beijinho grande!
Anita says
Olá Cláudia, adorei o teu post porque justamente o Slow Living é um tema que me diz muito, aliás já escrevi sobre ele, aqui: http://www.look-a-day.com/2015/07/feel-slow-living-vive-o-melhor-possivel.html Eu própria tento não entrar na ‘rodinha do hamster’ desta correria em que anda toda a gente, em que estar sempre ocupado e não ter tempo para nada parece ser o cool e esforçar-me por desacelerar, só que muitas vezes bate aquela culpa de sentir que não estou a fazer o suficiente. Mas estou, estamos todos a fazer mais do que suficiente, temos que fazer é menos, viver mais, parar e desligar mais, comtemplar mais – como as cores de Lisboa que tão bem captaste (as fotos estão lindas). :) Houve uma edição da Kinfolk que falava justamente sobre o tema e se te interessa, o guru do slow movement é este senhor: http://www.carlhonore.com/. E essa revista, a Flow, só sigo pelo instagram mas tenho que ver se a apanho em modo físico! ;)
claudia says
Olá Anita! Obrigada pelo teu feedback! Não sabia deste senhor, embora a cara dele não me seja estranha, e fui pesquisar! Acho que lhe vou comprar um livro! Gosto muito do que ando a descobrir sobre este movimento e gosto de saber que as pessoas se sentem identificadas com o mesmo. Acho que para muitos a felicidade não está na velocidade, mas sim no compasso com que se apreciam as coisas que nos rodeiam! Obrigada pelas recomendações! Adorei! Um beijinho!!!
Anita says
É mesmo, é bom saber que nem toda a gente quer andar a correr atrás de mais, mais, mais e procura viver melhor, mais devagar. ;) De nada! :D Se sempre comprares o livro, depois dá o feedback! ;) Beijinho
sara (kanpai) says
que bom ler este texto teu, tenho algumas saudades dos teus posts mais pessoais confesso! tb li esse artigo e tb gostei mto.
ja’ ha’ anos q penso neste tema – em Londres encontrei um espaco mental q n tinha em Lisboa (iro’nico n e’!) mas agora desde q tive um filho os dias parecem cada vez mais a correr. Ha’ muito da nossa atitude em conquistar os dias, estar mais presente no momento, mesmo se o trabalho e’ muito! Beijinhos e boa viagem para encontrares o teu equilibrio!
ana . meiomaio says
Tão, tão bonitos esses tons pastel de Lisboa. E tu sabes captá-los como ninguém… Lindas, lindas (todas!)
Um beijinho!