Já é bem sabido que nós somos os nossos maiores críticos. Cada qual com a sua dose de auto-confiança, uns mais assumidamente confiantes, outros menos, uns com mais confiança aqui e acolá e outros que acham que estão sempre mal, e nada está bem, nem parece bem.
Como fotógrafa, invariavelmente cruzo-me com clientes que irão fazer uma sessão pela primeira vez, que se sentem nervosos, que assumem logo ao primeiro minuto que a coisa vai correr mal. Outros que entram de forma mais descontraída e sem parecer que nada os incomoda, nem quando beijam a(o) seu/sua mais-que-tudo e eu estou ali a uns 45cm de distância.
Os mais nervosos denotam alguma tensão, alguns sorrisos nervosos, alguns olhares pouco descontraídos, eventualmente as mãos e braços começam a parecer algo que estorva e não sabem o que lhes hão-de fazer. E até o olhar para a máquina pode causar alguma tensão. Bem sei que às vezes não parece, mas há qualquer coisa que se transmite quando não se está à vontade… e eu consigo ver isso.
Por isso, gosto de passear, de conversar, de entrar em modo “passeio de amigos por sítios bonitos” e tirar partido dessa descontração natural que advém deste modo de passeio. Mas claro, nós sabemos que mesmo descontraídos, é muito possível que olhemos para a fotografia que nos foi tirada e não gostarmos de algo… seja o nariz, os olhos, a testa, as orelhas, o sorriso… E mesmo que mais ninguém consiga ver esses defeitos, nós conseguimos.
Também por este motivo, durante o meu Projecto 365, queria dar ênfase aos auto-retratos. Por várias razões, mas principalmente porque é extremamente difícil (tecnicamente alinhar o foco é por si só uma tarefa hercúlea) e porque seria eu a expor-me à frente da máquina sozinha. Teria de pensar em algum conceito, para não correr o risco de parecer a pessoa com o ar mais tolo do mundo. E demorei algum tempo, fiz várias tentativas… dois dias seguidos, e ao segundo dia senti-me feliz com o desafio superado.
A forma como se olha para a máquina é quase intimidante. Olha-se a pensar em quê? Temos de pensar em alguma coisa, porque senão vou olhar para o meu auto-retrato e vejo um olhar vazio. Quero um olhar cheio! Quero expressão, quero… algo que se sinta. E de facto não é fácil. E não é fácil porque eu também vejo logo à distância os defeitos, as coisinhas pequenas que não gosto, seja a testa à Christina Ricci, os dentes tortos que fazem com que de lado não possa estar, ou corro o risco de alguém achar que tenho os dentes da frente partidos, ou o facto de achar outras tantas coisas estranhas e não propriamente bonitas.
E isto faz com que eu perceba melhor o que se sente quando se está do outro lado, quando se olha para a nossa própria fotografia, mas também faz com que perceba melhor como posso salientar o melhor de cada um, durante a fotografia ou na forma como educo o cliente na sua auto-percepção. Porque acima de tudo, grande parte das vezes é apenas uma questão de auto-confiança, de teimosia em relação a um detalhe que ninguém nota e que não faz a diferença. Aliás faz uma diferença, faz com que aquela pessoa sejamos nós e mais ninguém.
Não acredito que todas as pessoas sejam bonitas, mas porque a beleza é algo muito subjectivo. Mas acredito que todos podemos ser pessoas interessantes, e sabemos bem que este “ser-se interessante” ultrapassa muitas vezes o aspecto físico com que fomos brindados. E se não ultrapassa logo, eventualmente ultrapassa quando conhecemos a pessoa. A beleza em si, de forma vazia, apenas pela beleza, esgota-se e o ser-se interessante não. Ser-se interessante cultiva-se e cresce connosco. E ser-se interessante é ser-se bonito de forma contínua.
Por isso também costumo dizer que não gostaria de voltar à adolescência, nem à década dos 20 anos. A falta de experiência de vida e de auto-confiança típicas daquela idade fazem com que não tenha propriamente saudades. Gosto muito mais de mim agora, ainda que com menos leveza no ar, mais rugas de expressão, um ou outro cabelo branco que surge sem convite e as pequenas coisas do costume e da idade. Por isso espero que com esta experiência de me atirar para auto-retratos a olhar de frente, de lado ou mais subjectivos, possa no final deste ano ser melhor no que faço – retratar as histórias das outras pessoas. As histórias que saem dos sorrisos e dos olhares.
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Little Miss Joey says
Gostei imenso do post e das fotografias!
E já agora, tens um cabelo para lá de fantástico!!
claudia says
Obrigada Joey :) Um beijinho grande!!
andrea says
demorei três horas a perceber que eras tu… e que surpresa boa esse cabelo solto! e como eu já sabia adorei ler o post. eu disse, ia ser a primeira da fila! muito bom… eu como já deves ter percebido sou daquelas que adora tirar fotografias, ver o resultado, mas se a máquina estiver na minha cara também faço uns sorrisos cheios de vergonha… mas no fundo, no fundo… gosto muito!
claudia says
Sim, eu de cabelo solto é qualquer coisa que costuma ser raro, ultimamente tenho-me permitido mais usar e abusar do longo cabelo, sem lhe pôr defeitos! :) Ahahah, ainda um dia me hás-de convidar para te fotografar! Um beijinho enorme!!
Diana says
Fiiu fiiiiuu!! Giraça!! ;) Beijinhos!!!
claudia says
ahahaha :) Obrigada amiga!! Volta depressa!! Beijinhos!
Simone Matos says
E olha, ficaste tão linda nas fotografias! Gostei muito do post, é mesmo isso que penso também…
“A beleza em si, de forma vazia, apenas pela beleza, esgota-se e o ser-se interessante não. Ser-se interessante cultiva-se e cresce connosco. E ser-se interessante é ser-se bonito de forma contínua.” fantástico! :)
claudia says
Olá Simone, tudo bem? Obrigada pelos elogios, que bom receber assim um comentário! Um beijinho enorme!!
Ana cooks says
Adorei este post… :)
claudia says
Olá Ana!! Obrigada pela visita e comentário! Fico feliz que tenhas gostado! Um beijinho grande!
Inês Leite Rosa says
Cláudia, concordo bastante com as tuas palavras. Eu também costumo dizer que gosto muito mais de mim agora, que me acho mais interessante e até mais bonita, dentro da minha concepção de beleza (às vezes, tão diferente da dos outros).
Não sei se vou achar grande piada ao meu aspecto daqui a uns bons anos, mas não tenho tido grandes problemas com a evolução do meu corpo – aquilo de que não gostava aos 15 anos continua a ser aquilo de que não gosto agora – e quando me olhei ao espelho numa manhã e descobri pequenas rugas no canto dos olhos, a minha reacção foi exactamente esta: “Ah! Que giro! Tenho aqui umas rugas pequeninas!” E disse isto a sorrir, porque foi completamente novo e inesperado. Aconteceu-me o mesmo quando vi o primeiro cabelo branco. Não, não quer dizer que não disfarço as olheiras ou a manchas a mais de que não gosto, não quer dizer que um dia não pintarei o meu cabelo. Quer dizer que é natural e que não há nada de errado comigo.
Estás linda nas fotografias, já agora ;)
claudia says
Inês minha querida, adorei ler o teu comentário!! E subscrevo o que dizes também! Tenho gostado de crescer e ver a evolução como pessoa, quer a nível psicológico, quer a nível físico. Como dizes, até ver, está tudo a correr bem! Daqui a uns anos veremos como estarei! Mas é isso, que seja tudo encarado com a naturalidade e se quisermos disfarçar algo, porque nos sentimos melhor assim, que o seja. A confiança é fundamental em qualquer decisão que tomemos! E obrigada pelos elogios! :) Um beijinho enorme!
Ana Leal says
Odeio que me tirem fotos!!!
Identifiquei-me com o que escreveste, vou aplicar a técnica do:…”Olha-se a pensar em quê? Temos de pensar em alguma coisa, porque senão vou olhar para o meu auto-retrato e vejo um olhar vazio. Quero um olhar cheio! Quero expressão, quero… algo que se sinta. ”
Beijinhos temos de combinnar outra sessão com os meus sobrinhos!
claudia says
Ahaha a começar assim esse comentário pensei que viesse daí coisa má! :) Mas quanto ao olhar é pensar em algo bom, porque a nossa expressão é outra inteiramente diferente. Think happy thoughts! Quanto à sessão com as crianças, que venha ela! E estou a dever-te um email! Um beijinho grande!
Cris says
Ficaste super gira nas fotos,temos modelo, para além de fotógrafa!
claudia says
Modelo não direi, mas pelo menos procuro saber o que é estar do outro lado ;) E obrigada pelas palavras doces! Um beijinho grande!
Constança says
Cláudia, mas que post tão bom! Gostei imenso, tanto das fotografias como das palavras. Parabéns por seres simultaneamente profunda e despretensiosa. Autêntica, acho que é isso. Gostei muito!
claudia says
Ah Constança, que bom ler as tuas palavras! Tendo sido tu uma inspiração tão grande no início da minha vida criativa, receber este teu comentário é absolutamente delicioso!! Obrigada também pela tua autenticidade! Um beijinho enorme para ti!!!
Sara says
Gostei muito deste post. Mostra maturidade e arte…
claudia says
Uau Sara, que bom!!! Obrigada, muito obrigada pelo comentário tão bonito! Um beijinho grande!